Olá!
Há muito que não falo convosco. Pessoalmente, pois claro. Ao telefone, imaginário, as conversas são diárias.
Aviso imediato: meti o carro cá dentro e, portanto, não estranhem uma sombra não identificada no jardim quando decidirem largar os cães para o “xixi” da meia-noite.
Já sei que é tarde. São para aí duas e meia da manhã. E depois? Já sabem e estão, por isso, habituados aos meus horários. Que querem? É o meu ritmo biológico… Idiossincrasias que mais ninguém, cá em casa, compreenderá. Excepção feita ao patriarca, noctívago como eu. Acho que foi, é, mais uma herança.
Reclamação: o jardim está uma desgraça. Há que chamar o “especialista” na matéria. [Por falar nisso, encontrei-o na escola da Areosa. Ia votar nas autárquicas. Está como novo…] Suspeito que dois dias não chegam. A “selva” já invade os caminhos…
Pois que, há muito, não falo convosco. Sabem, a vida é assim. Feita de altos e baixos, de felicidade e tristeza, de venturas e desventuras, de presenças e ausências. De vazios físicos, de plenitudes imaginárias, enfim, é a vida que levamos.
Sabem outra coisa? Não tenho andado muito pelo Minho. Há meses que não vejo os Avós nem a Madrinha… Mas tenho-os sentido… Prometo ir lá muito em breve. Apesar do vento levar rapidamente as promessas. Mas esta está escrita. E, assim sendo, é para cumprir…
Vim cá hoje para falar convosco. Para saber como estão e como vão as coisas. Parece-me que está tudo bem. Fico contente.
Mas a razão verdadeira da minha visita é para vos dizer que vão ser Avós pela segunda vez. Pois, Mãe, lá vais tu dizer que sou muito novo para isso, que a vida é longa e que um filho é um encargo eterno.
Pois, mas é verdade. Vem aí uma menina. Olha que coisa. Outra menina. Pronto, foi o que se arranjou... Que querem?
Outra coisa. Obrigado pelos telefonemas de terça-feira. Sei, ou pelo menos imagino, que quando me deste os parabéns, sim tu, Mãe, o Pai estava na casa de banho. Também ficas a saber que me acordaste. O Pai, pelo menos, transmitiu-me um ritmo biológico diferente. Menos madrugador. E, por isso, parabenizou-me – se estivesses viva, este verbo arrepiar-te-ia, mas olha que existe mesmo nos dicionários, que não o do Francisco Torrinha – pouco depois do almoço. Lá para as três, pois que o horário, ele, um galaico-português genuíno, professava ritmos mais distintos.
[Até se gabava de pôr os aviões à sua espera. Verdade. Fui testemunha disso.]
Pronto, já são três e muito e deixo-vos dormir. Com esta novidade que vos deixo. Já sei, fecho a porta da cozinha e o portão à chave. [Já agora passo pela “dispensa” lá de baixo e “roubo” mais umas garrafas. Pronto Mãe, tá bem, só levo meia-dúzia…]
Domingo cá voltarei com mais novidades. Amanhã à noite digo se trago, trazemos, o almoço ou vamos a qualquer lado.
PS: Esqueci-me de vos dizer. Saí do jornal, esse mesmo onde entrei em 1978. Fui despedido via telefone. É, agora as coisas são diferentes. Mas não tem mal. A Graça diz que foi o melhor que me aconteceu. Ela já tinha saído. Acho que ela tem razão. Continuo, pelo menos assim o julgo, a saber escrever em Português e, embora tenha a máquina aqui ao lado, já aprendi a mexer em computadores. Amanhã, se tiver pachorra para isso, monto o gira-discos e prometo (re)começar a ouvir um dos duzentos e tais “vinis” que cá moram.
PS1: Segundo e terceiro esquecimentos.
Chamar-se-á Mafalda. O arranjo dos apelidos é que ainda não está assente. Logo mais, lá para Julho, se verá.
Imaginem que, na próxima terça-feira, vou jantar de novo com alguns dos meus amigos de infância, os tais que entravam pela cozinha sem avisar ninguém. Nem os pais deles. Eras tu, Mãe, que os avisavas onde eles andavam. O Zé Carlos, o Luís e outros que tais. Vai ser outro jantar de jarretas…
Aviso imediato: meti o carro cá dentro e, portanto, não estranhem uma sombra não identificada no jardim quando decidirem largar os cães para o “xixi” da meia-noite.
Já sei que é tarde. São para aí duas e meia da manhã. E depois? Já sabem e estão, por isso, habituados aos meus horários. Que querem? É o meu ritmo biológico… Idiossincrasias que mais ninguém, cá em casa, compreenderá. Excepção feita ao patriarca, noctívago como eu. Acho que foi, é, mais uma herança.
Reclamação: o jardim está uma desgraça. Há que chamar o “especialista” na matéria. [Por falar nisso, encontrei-o na escola da Areosa. Ia votar nas autárquicas. Está como novo…] Suspeito que dois dias não chegam. A “selva” já invade os caminhos…
Pois que, há muito, não falo convosco. Sabem, a vida é assim. Feita de altos e baixos, de felicidade e tristeza, de venturas e desventuras, de presenças e ausências. De vazios físicos, de plenitudes imaginárias, enfim, é a vida que levamos.
Sabem outra coisa? Não tenho andado muito pelo Minho. Há meses que não vejo os Avós nem a Madrinha… Mas tenho-os sentido… Prometo ir lá muito em breve. Apesar do vento levar rapidamente as promessas. Mas esta está escrita. E, assim sendo, é para cumprir…
Vim cá hoje para falar convosco. Para saber como estão e como vão as coisas. Parece-me que está tudo bem. Fico contente.
Mas a razão verdadeira da minha visita é para vos dizer que vão ser Avós pela segunda vez. Pois, Mãe, lá vais tu dizer que sou muito novo para isso, que a vida é longa e que um filho é um encargo eterno.
Pois, mas é verdade. Vem aí uma menina. Olha que coisa. Outra menina. Pronto, foi o que se arranjou... Que querem?
Outra coisa. Obrigado pelos telefonemas de terça-feira. Sei, ou pelo menos imagino, que quando me deste os parabéns, sim tu, Mãe, o Pai estava na casa de banho. Também ficas a saber que me acordaste. O Pai, pelo menos, transmitiu-me um ritmo biológico diferente. Menos madrugador. E, por isso, parabenizou-me – se estivesses viva, este verbo arrepiar-te-ia, mas olha que existe mesmo nos dicionários, que não o do Francisco Torrinha – pouco depois do almoço. Lá para as três, pois que o horário, ele, um galaico-português genuíno, professava ritmos mais distintos.
[Até se gabava de pôr os aviões à sua espera. Verdade. Fui testemunha disso.]
Pronto, já são três e muito e deixo-vos dormir. Com esta novidade que vos deixo. Já sei, fecho a porta da cozinha e o portão à chave. [Já agora passo pela “dispensa” lá de baixo e “roubo” mais umas garrafas. Pronto Mãe, tá bem, só levo meia-dúzia…]
Domingo cá voltarei com mais novidades. Amanhã à noite digo se trago, trazemos, o almoço ou vamos a qualquer lado.
PS: Esqueci-me de vos dizer. Saí do jornal, esse mesmo onde entrei em 1978. Fui despedido via telefone. É, agora as coisas são diferentes. Mas não tem mal. A Graça diz que foi o melhor que me aconteceu. Ela já tinha saído. Acho que ela tem razão. Continuo, pelo menos assim o julgo, a saber escrever em Português e, embora tenha a máquina aqui ao lado, já aprendi a mexer em computadores. Amanhã, se tiver pachorra para isso, monto o gira-discos e prometo (re)começar a ouvir um dos duzentos e tais “vinis” que cá moram.
PS1: Segundo e terceiro esquecimentos.
Chamar-se-á Mafalda. O arranjo dos apelidos é que ainda não está assente. Logo mais, lá para Julho, se verá.
Imaginem que, na próxima terça-feira, vou jantar de novo com alguns dos meus amigos de infância, os tais que entravam pela cozinha sem avisar ninguém. Nem os pais deles. Eras tu, Mãe, que os avisavas onde eles andavam. O Zé Carlos, o Luís e outros que tais. Vai ser outro jantar de jarretas…
5 Comments:
Imagino que só uma pessoa saudável possa pensar nessas coisas. Não me lembro de absolutamente nada, quando me esforço para pensar nos 4 anos que vivi com os meus pais, juntos. Impressionante. Dir-se-ia que a criança apagou, para não se magoar, todas essas recordações.
E não magoou, de facto, aparentemente, durante anos a fio, mas marcou, mais do que se possa imaginar, mais do que eu próprio possa alguma vez pensar.
Sofremos de qualquer maneira...ou com as recordações ou com a falta delas...preso por ter tido pai, preso por não ter tido.
Será por isso que eu raramente tenho certezas? Se me lembrasse do que o meu pai dizia, imitava-o, cheio de autoridade. Até dava aspecto de homem seguro, decidido, emocionalmente estável...
Que desgraça. Quando começo a pensar no que me tornei, e que faltou um pai...não sou nenhum mostro, não. Mas eu não sei quem sou, não sei o que quero nem para onde vou. A música do Variações está para mim como o queijo para a marmelada..."estou bem, aonde eu não estou, porque eu só quero ir, para onde eu não vou"...e isto aplica-se não só ao "estar", como ao "estar com", ao "ser"...
Acho que vou ter que arranjar ajuda, asim não vou longe.
Eu sei que isto aqui é pra gente saudável, mas sei que não te importarás (muito) com isto
Não assino, mas é óvio que sou eu...
Descupa, não quis estragar o teu momento com os teus pais. Apenas me lembrei de umas coisas e escrevi-as. Espero não me arrepender...
A Memória. O nosso mais fiel e perene valor. O verdadeiro e único indício que estamos vivos, e enquanto o estivermos, recordaremos.
Não duvido que a Mafalda, que já aí vem a caminho, vai sentir exactamente o mesmo Amor por vocês, que tu e Graça sentem pelos vossos Pais.E, de lá do fundo da minha imaturidade, acho que não há maior e melhor recompensa para um Pai/Mãe do que essa.
Comecei a ler o teu post, e as lágrimas caíram sem parar… Todos os dias falo com o meu Pai. Lembro-me quando ele me perguntava, um ou dois anos depois de casarmos, quando lhe íamos dar um neto. Depois deixou de perguntar. Agora, digo-lhe todas as noites, conto-lhe todas as novidades. (Ele era o primeiro a aproveitar qualquer data/acontecimento para abrir um garrafa de champagne)
Jorge, se não fosses tu, não teria conseguido ultrapassar a primeira fase, Sempre me deste força, sempre disseste que íamos conseguir. Tu é que foste forte, eu fui abaixo muitas vezes…
(Mafalda: guerreira, que combate com energia. É isso que a nossa bebé é, desde o principio)
Caro anónimo, lembro-me um dia quando chegaste lá a casa e disseste ao meu Pai que ias casar. (Não tinhas que o fazer, mas fizeste) Podes não ter tido um pai presente, mas tiveste muitos outros “pais”, que gostavam de ti, que se interessavam por ti. E isso é que é importante!
É sempre bom recordar...
Anónimo, se quiseres podes "apoiar-te" nas boas recordações que tenho do meu, e usá-las como tuas.
Sempre que precisares tens aqui um ombro amigo, como sabes.
O mesmo ombro dá para o resto da família, claro.
Abraço
Aliás, lembro-me perfeitamente que o meu pai ficava preocupado, e por vezes chateado, com certas decisões que tomaste na tua vida (como eu e como muitos outros...), como por exemplo alguns negócios "da china" que fizeste ou mesmo quando anunciaste o teu casamento (e consequente reconversão). Ele percebia perfeitamente a tua situação (e do teu irmão), e espírito paternal, a ele, não lhe faltava. O hábito faz o monge. Agora percebo um pouco como te sentias, mas tenho sempre as boas recordações.
Quanto à conversa do Jorge, percebe-se o respeito e o carinho de antigamente. Próximo do que eu também pude saborear. A maior parte das vezes é em alturas menos positivas que recordamos mais. Talvez a tentar descobrir uma solução para determinado problema nos ditos dos nossos entes queridos, em conselhos ou situações, onde por vezes gritamos em silêncio "Cá está!" seguido de um emocionado "Obrigado...", ou simplesmente recordamos sem que qualquer solução advenha. Mas sempre reconfortamos o nosso coração com boas memórias.
A eles devemos o que somos, e se não somos aquilo que queriamos, algo correu mal, algo que nos passou ao lado ou não foi entendido da melhor maneira. Ninguém é super-herói. Nem foram eles, nem seremos nós com os nossos filhos. Foram aquilo que lhes foi permitido ser e foram nossos pais...
"Honra os teus mortos
É deles que tu vens
Deve-lhes culto.
Que são os vivos?
A sombra dos mortos
Que fazem vulto."
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