quinta-feira, março 24, 2005

Páscoa

Já não me recordo há quantos anos foi. Pela cronologia dos automóveis, terá sido no OO-??-??, um Mercedes 180 que uma família amuada terá ido para cima. Para cima queria dizer qualquer coisa como mais de duas horas de caminho, pela EN-13 que começava – o percurso – ali para os lados de Matosinhos. Para quem vinha das Antas, pois claro.
Os Pais desavindos. A minha Mãe nunca achou grande piada às reuniões familiares dos S..... e dos A.... Lá teria as suas razões. Anos mais tarde, compreendi-a. Embora ache que havia, por ali, alguma rigidez intelectual. Claro, uma das primeiras licenciadas pela Universidade do Porto, que iria ela fazer fazer à província? Aturar um grupo de borracholas, capazes dos maiores desmandos e atentados?
(Acabo de recordar a matrícula: OO-14-67)
O meu Pai, acho que ia com prazer. Embora a ausência do Velho (Pai) fosse difícil de disfarçar.
É curioso: mantenho algumas imagens fortes do meu Avô mas, para espanto meu, não há nenhuma em Valença do Minho.
No Marquês de Pombal 167, na Rua de Passos Manuel 76, em Honório de Lima, mas nada do Campo do Exercício.
Já não me recordo onde dormíamos, que a casa de Valença estava interdita à família, julgo que por insalubridade. A “bióloga” assim o determinava.
Sei que chegamos lá por volta da hora de almoço. Imagino o barulho que deve ter havido cá pelo Porto para obrigar o meu Pai a cumprir horas. (Herdei dele esta característica genética. Mas ele gabava-se de pôr aviões à sua espera. E disso fui testemunha…)
Logo à chegada, e não era grande novidade, peguei-me ao estalo com o meu primo António. Ninguém ligava, era prática habitual, mas devo ter levado uns correctivos porque me lembro de ter ido brincar para a vacaria.
Ao almoço deveríamos ser para aí uns quarenta. O que não era nada difícil. Entre familiares directos, penetras, amigos, inimigos e outros que tais, aquilo mais parecia um refeitório da tropa.
Lembro-me perfeitamente que a cozinha - onde pontificava a mulher do caseiro e mais umas moçoilas que a ausência de hormonas me fez esquecer – dava para três salas da minha (actual casa. A tia Inácia, com aquele timbre de voz que espantava mortos e irritava os vivos, tudo comandava.
Claro que os almoços eram intermináveis. O que, para nós, putos, era um tortura. A vantagem era ter por nossa conta uma área enorme.
Um dos grandes divertimentos era ir à casa de banho. Um desafio. Imaginem um quarto, com janela, onde encostada à parede havia um lambril de madeira com dois buracos, ambos com tampa. O da direita era para os líquidos; o da esquerda para os sólidos mais malcheirosos. Ambos davam para o feno, destinado ao gado.
Havia vacas, porcos, galinhas e porcos. Milho, vinha, árvores de fruto e uma felicidade, artificial ou não, que ainda hoje recordo.
E tios e primos já desaparecidos. E uma família que, em boa verdade, se foi lentamente extinguindo e da qual restam, com conhecimento directo de causa, três.
Perdoem-me a linguagem, pouco apropriada a este blog. Porra, que andamos nós a fazer?
Pai e Mãe, sinto a vossa falta…

1 Comments:

Blogger G. said...

Saudades,

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...
Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida ...
Saudade é sentir que existe o que não existe mais...
Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam ...
Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.
E esse é o maior dos sofrimentos: não ter por
quem sentir saudades, passar pela vida e não viver.
O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido...

Pablo Neruda

24/3/05 10:51  

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